O SANTO
QUE CAIU DO ALTAR
(uma
história real)
LEIAM! É um
pouco longa, pros nossos padrões, mas muito interessante!)
by Robério Matos
Nos anos
sessenta, morávamos eu e o Chico, meu primo, em Juazeiro do
Norte-CE, cidade-santuário, onde maioria absoluta dos cidadãos é de origem
católica e devota do Padre Cícero Romão Batista. Na época, tínhamos entre
10 e 12 anos de idade, respectivamente.
Nossos pais
eram de origem muito humilde, por isso, de quando em vez, íamos passar
o dia na casa de nossos avós, os quais tinham uma condição financeira
melhor que a nossa, pois vovô Astrogildo era o Coletor da Cidade (tipo um
Tabelião do único cartório existente no município).
Então,
quando a coisa não estava muito boa em nossas casas, íamos pegar o 0800
(almoço) na casa da vó Mãezinha, como a tratávamos carinhosamente, daí às
vezes ficávamos para o jantar e também dormíamos lá.
Vovó era
talvez a mais católica de todos os habitantes da cidade e devota fervorosa
do “Padim Pádi Ciço”, além de outro punhado de santos, cujas réplicas, de
barro, ela mantinha em uma espécie de santuário, feito de madeira e preso
à parede da sala de jantar.
Certo dia eu
e o Chico pegamos Mãezinha ajeitando um lugarzinho para um santo novo, no
já muito apertado e congestionado altar.
- Vó, esse é
novo? – perguntei.
- É sim, meu
filho.
- E o que
ele faz (de milagre, ironizei)?
- Robério,
lá onde eu comprei, o Seu Damião me garantiu que esse é o santo dos apertados.
Ele dá
dinheiro, meu filho!
Olhei pro
Chico. Ele também me fitou meio que de lado, e ficamos entre um misto de
animados e desconfiados, ante a perspectiva do novo santo poder quebrar
nosso galho, para irmos ao campo de futebol, cinemas, etc.
- E, vó,
como que ele faz isso? É assim “na lata” mesmo? Ele mete a mão no bolso e dá o
dinheiro?
- Não,
menino. A gente coloca de baixo dele uma nota de 1 cruzeiro novo, por exemplo,
faz a reza, e, no dia seguinte, pela manhã, logo cedo, vai lá e encontra 2
cruzeiros novos, e assim sucessivamente.
- Ah, tá...
Respondemos quase em uníssono, eu e o Chico.
- Então vó –
voltei a perturbar – isso já não é milagre. Tá mais pra jogo-do-bicho, só com
uma grande desvantagem, pois esse paga 15 vezes mais o valor da aposta,
enquanto que o sovina do santo, só uma vez mais...
Foi aquele
“puxão de orelha”, seguido de um sermão. Só que você tá esquecendo de um
detalhe importante Robério, seu sabichão: o santo dá pouco mas é certo. É
toma-lá-dá-cá, né?
- Vó,
interveio o Chico, vamos deixar de conversa e por a “experiência” (apelou, o
primo) em prática. Isso ele falou já por volta das 18h. Hora da Ave-Maria.
Então
Mãezinha não se fez de rogada. Pegou uma nota de 1 cruzeiro novo, fez a reza e
colocou a bufunfa de baixo do santo.
Alta
madrugada, eu e o Chico, descemos de nossas redes e, pé-ante-pé, fomos lá no
santuário e colocamos mais um cruzeiro novo de baixo do santo e voltamos
para nossas redes de dormir.
Pela manhã,
hora do café, lá vem Mãezinha, radiante e jocosamente mostrando para nós as
duas notas de um cruzeiro novo, cada.
E assim se
seguiu por alguns dias. Ela colocava 2, nós cobríamos com 4. Botava 5, nós dez!
Mas veio um
dia que a ganância suplantou a fé da nossa devota vó Mãezinha: ela colocou
50 pratas de baixo do santo. Certamente “tomara emprestado” do marido,
nosso vô.
E agora,
Chico? D’onde que nós vamos arranjar 100 paus!
- Que nada,
primo. Nós desta vez não vamos cobrir a parada. Vamos “passar”, como se
diz nos jogos de azar.
Madrugada.
Fomos lá, como de costume, no santuário e tiramos os 50 mangos do santo, e,
ofegantes, voltamos para nossas redes, com um detalhe, que pois um bom termo em
nossa fonte de renda: o nervoso, somado à pressa e ansiedade, fez com que
derrubássemos o santo do altar, fazendo o danado – com todo o respeito -
se estatelar no chão.
Dia
seguinte, bem cedo, Mãezinha dana-se a sacudir nossas redes: Robério...
Chico... Venham cá, depressa!
(e aqui
resumimos o final da história).
- Como vocês
me explicam isso? Além dos 50 cruzeiros novos haverem sumido
“misteriosamente”, meu santim caiu do altar, e vejam aqui!
Quase não
contivemos o riso ao vermos o busto do santo em uma das mãos da vó, e a
cabeça do dito “cambista” na outra...
- Sei não,
vó! Cuidei em tentar contornar (e só piorei mais ainda) aquela vexatória
situação.
Vai ver que
ele, duro, viu que não tinha como cobrir “uma aposta” tão alta e,
envergonhado, saltou do Santuário, cometendo suicídio...
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